As sessões virtuais/telepresenciais têm agilizado o ritmo de julgamentos do STF, que, além dos diversos temas fiscais analisados em 2020, continuam a tratar de temas tributários relevantes nesse início de 2021.

Algumas decisões têm surpreendido os contribuintes, positiva ou negativamente, seja pela alteração na jurisprudência da Corte, seja pelas estruturas incomuns de modulação de efeitos.

Valem ser citadas:

– ICMS x ISS sobre licenciamento de software

Alterando uma jurisprudência já antiga do STF, a Corte decidiu que sobre o licenciamento de software deve incidir unicamente o ISS, independentemente da natureza de tal programa (se customizado ou se “de prateleira”).

A Corte também modulou os efeitos de sua decisão, justamente em razão da alteração do entendimento e do potencial de conflitos que ela poderia gerar, estabelecendo os seguintes critérios, tendo como marco temporal a publicação da ata de julgamento:

  1. Quem recolheu somente ICMS: não terá direito à restituição do tributo, mas não poderão ser cobrados pelos Municípios em relação ao ISS.
  2. Quem recolheu somente o ISS: fica resguardado e não poderá ser cobrado em relação ao ICMS.
  3. Quem não recolheu nem o ICMS nem o ISS: o ISS poderá ser exigido, respeitado o prazo de prescrição.
  4. Quem recolheu o ISS e o ICMS, mas não ingressou com ação para restituição: poderá pleitear a restituição do ICMS (mesmo se não houver ainda ação judicial em curso).
  5. Quem ajuizou ação em face dos Estados para questionar a incidência do ICMS: deverá ter a ação julgada de acordo com a nova orientação do STF, ou seja, pela incidência apenas do ISS, com possibilidade de restituição do ICMS.
  6. Em relação a ações judiciais, inclusive execuções fiscais ajuizadas por Estados, visando a cobrança do ICMS: deverá ser observado o novo entendimento do STF, ou seja, pela incidência apenas do ISS.
  7. Em relação a ações judiciais, inclusive execuções fiscais ajuizadas por municípios, visando a cobrança do ISS: deverá ser observado o novo entendimento do STF, ou seja, pela incidência apenas do ISS, salvo se o contribuinte já recolheu o ICMS (item 1).
  8. Quem ajuizou ação contra os municípios, para questionar a incidência do ISS: deverá ser observado o novo entendimento do STF, ou seja, pela incidência apenas do ISS.

Apesar de complexa, essa modulação de efeitos parece trazer maior segurança aos contribuintes, além de evitar a bitributação, apesar de, em alguns casos resultar em um encargo maior para o contribuinte (como no caso de quem vinha recolhendo apenas o ICMS).

– Diferencial de alíquota do ICMS após EC 87/2015

Também em um tema altamente complexo e que afeta milhões de contribuintes, o STF decidiu que a cobrança do diferencial de alíquota no caso de operações interestaduais envolvendo consumidores finais não contribuintes do ICMS, com base no Convênio ICMS 93/2015, é inconstitucional.

Esse diferencial de alíquota foi instituído após a Emenda Constitucional 87/2015 e teve como objetivo, principalmente, atender à demanda de alguns Estados em relação ao comércio eletrônico, que antes acabava por concentrar a tributação sobre tais operações nos Estados de origem (em sua maioria localizados nas regiões Sul e Sudeste).

Após tal Emenda, a Constituição passou a prever a divisão do ICMS sobre essas operações, concedendo aos Estados de destino o direito de cobrar a diferença entre a alíquota interna de tais Estados e a alíquota interestadual.

Para regulamentar essa nova modalidade de incidência, foi firmado o Convênio ICMS 93/2015 pelos Estados.

O STF, porém, declarou agora que a cobrança do diferencial de alíquota com base apenas no Convênio é inconstitucional, pois seria preciso editar, antes, Lei Complementar para regulamentar o tema.

Também prevendo o potencial impacto dessa decisão, o STF modulou os efeitos da decisão, para determinar que a cobrança poderá persistir até o final de 2021. Se não for editada Lei Complementar ainda nesse ano, a cobrança será inconstitucional em 2022.

– Inclusão do ICMS da base da CPRB (Contribuição Previdenciária sobre Receita Bruta)

Apesar de ainda não ter havido conclusão do julgamento, já há maioria formada entre os Ministros para decidir que o ICMS deve ser incluído na base da CPRB.

Na esteira da decisão do STF que em 2017 decidiu que o ICMS não se inclui na base do PIS e da COFINS, outras teses surgiram e foram levadas ao Judiciário pelos contribuintes, como a da exclusão do ICMS da base da CPRB, sob o argumento de que a base de cálculo da CPRB seria a mesma do PIS/COFINS.

Em sendo a mesma base de cálculo, a decisão tomada anteriormente pelo STF deveria se aplicar a esse tributo. Essa era, inclusive, a orientação do STJ sobre o tema.

Agora, porém, o STF entendeu que pelo fato de a CPRB ser um regime optativo, o legislador teria maior liberdade na definição da sua base de cálculo, de maneira que a inclusão do ICMS não representaria uma inconstitucionalidade.

Espera-se que o STF seja ainda provocado a se manifestar sobre o fato de que a CPRB apenas se tornou optativa em 2015, sendo que durante muitos anos ela foi um regime obrigatório para diversos setores da economia.

– ITBI sobre cessão de compromisso de compra e venda de imóveis

O STF também reiterou sua jurisprudência e novamente declarou que o ITBI apenas pode incidir nas situações em que há efetiva transferência de propriedade do imóvel, i.e. registro em cartório.

Assim, a cessão ou transferência de um compromisso de compra e venda não registrado não atrairia a incidência do ITBI.

– ITCMD sobre herança e doações do exterior

Outro tema que está em pauta e aguarda finalização do julgamento diz respeito à constitucionalidade da exigência, pelos Estados, do ITCMD sobre heranças e doações vindas do exterior.

A Constituição Federal prevê a necessidade de Lei Complementar para regulamentar o ITCMD nessas situações. Tal Lei nunca foi editada, o que levou muitos Estados a editar leis estaduais próprias para cobrar o imposto.

Assim, o STF deverá definir se a ausência de LC legitima a regulamentação do imposto pelos Estados.

Por ora, o placar está empatado, com três votos pela inconstitucionalidade da legislação estadual e três votos pela sua legitimidade.

Atualização (01/03)

Seguindo os julgamentos relevantes em temas tributários que mencionamos em nosso último Alert, o STF finalizou na sexta-feira passada (26/02) o julgamento do tema relativo à possibilidade de incidência do ITCMD sobre herança e doações do exterior.

O julgamento foi movimentado, inclusive com ajustes e alterações de votos no percurso.

Ao final, o STF, por maioria, declarou a necessidade de Lei Complementar para regulamentar as hipóteses de incidência do ITCMD sobre heranças e doações do exterior (mais especificamente, situações envolvendo (i) herança de bens localizados no exterior; (ii) herança com inventário processado no exterior; (iii) herança com falecido residente ou domiciliado no exterior; e (iv) doação com doador residente ou domiciliado no exterior).

O STF fixou a seguinte tese: “É vedado aos Estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1º, III, da CF/1988 sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional” e, no caso, declarou que a legislação de São Paulo que trata do tema teria eficácia contida, só podendo produzir efeitos após a edição de Lei Complementar e, claro, se não conflitar com ela.

Aguarda-se, agora, maiores detalhes acerca da modulação de efeitos dessa decisão. Os termos de modulação propostos pelo Ministro Dias Toffoli foram os seguintes:

“10. Proponho a atribuição à decisão de eficácia ex nunc a contar da publicação do acórdão em questão, ressalvando as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo momento, nas quais se discuta:

(1) a qual Estado o contribuinte deve efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; e

(2) a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente.”

Assim, acaso o STF acate a proposta, a decisão apenas valeria para o futuro, ressalvando contribuintes que já ajuizaram ação para questionar a incidência do imposto, sem que tenha havido seu pagamento.

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